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“A alegria está na luta, na tentativa, no sofrimento envolvido e não na vitoria propriamente dita”.
Mahatma Gandhi

domingo, 26 de dezembro de 2010

Conciliar é legal?

"Mais importante do que apenas conciliar é julgar"

Há muito tempo afirmo que a Justiça é assoberbada de processos porque a Administração Pública não reconhece/resolve os mais comezinhos direitos dos cidadãos e o próprio Poder Judiciário restringe a legitimidade do Ministério Público para ajuizar as ações cíveis públicas nas situações de massa (FGTS, casa própria, poupança, etc).

A Constituição Federal assegura a todos que buscam o Judiciário, um processo rápido, em razão do princípio da sua razoável duração.

Bastante válida a iniciativa dos órgãos do Poder Judiciário incentivando todos a adotarem a conciliação, por ser o meio mais rápido de se resolverem os conflitos judiciais que, em muitos casos, se eternizam.

Já no ano de 2007 se criara muita expectativa em torno do "Conciliar é legal", mas o resultado não foi o esperado pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Poder Judiciário como um todo. É que na Justiça Federal da 5ª. Região os dados em termos de conciliação foram apenas razoáveis (CE 56,27%;PE 55,37%;AL 43,54%;RN 66,4%;SE 53,23% e PB 33,85), o que não deve ter sido diferente nas demais Justiças por esse Brasil afora. Excelente seria se o percentual de conciliação chegasse pelo menos a 80%.

Nos anos seguintes os esforços continuaram, mas não foi diferente, e agora em 2010, pelo menos na Justiça Federal, da 5ª.Região, o percentual foi ainda menor, ou seja, 47,24%. Na Seção Judiciária do Ceará ainda foi bem menor, 43,12%.

E porque nos juizados federais o resultado não foi o tão esperado também em 2010? É simples explicar: os advogados de diversos processos têm de se desdobrar/deslocar para comparecer aos diversos atos (em diversas varas e em locais diferentes) o que termina por não serem realizadas todas as audiências previamente designadas nessa semana da conciliação porque a parte não se sente segura sem a presença do seu advogado.

Para que essa boa ideia de pôr logo fim aos litígios judiciais não transpareça constituir um mero marketing do Poder Judiciário, sob a ideia de que a conciliação só se dá durante uma semana por ano, é mais do que indispensável se diga que nos Juizados Federais as conciliações são realizadas de segunda às sextas-feiras e durante todos os anos, ou seja realiza-se uma única audiência que, se frustrada a conciliação, imediatamente se passa à instrução e julgamento (colheita das provas). Com isso, o julgamento também é mais rápido. Conciliação em apenas uma semana do ano é para quem não trabalha ou não tem consciência da função de resolver os litígios. A grande maioria dos magistrados brasileiros é dedicada, chegando a sacrificar suas noites, finais de semana e a própria família, para julgar os processos, tanto que o Poder Judiciário brasileiro é um dos mais produtivos do mundo, conforme conclusões do estudo Brasil: fazendo com que a Justiça conte, produzido pelo Banco Mundial (Bird) e divulgado quinta-feira, 6, de dezembro de 2007, em Brasília, no evento promovido pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) em parceira com o Supremo Tribunal Federal (STF).

Nos juizados federais da 5ª Região, cada juiz profere, em média, de 400 a 600 decisões por mês. Nos demais Estados, dependendo da quantidade de processos existentes, um juiz federal pode produzir cerca de 1.000 decisões mensais.

A magistratura é sacrifício/sacerdócio. Quem nela quiser ingressar, que o faça demonstrando sua capacidade, se submetendo no chamado primeiro grau de jurisdição, a rigoroso concurso público, de títulos e de provas de todos os ramos do Direito, não dependendo de políticos nem de absolutamente ninguém. Nos tribunais, todavia, o acesso não se dá através de concurso público.

Mais importante do que apenas conciliar, que depende mais da vontade das partes é julgar, eis que, em regra, depende só do juiz, sendo mais do que necessária uma fiscalização efetiva no trabalho do magistrado por parte de sua Corregedoria ou do Conselho Nacional de Justiça. Por outro lado, não é também possível um juiz ter dez, vinte ou trinta mil processos, eis que a morosidade termina beneficiando o réu, via de regra, o Poder Público, já tão cheio de privilégios, e prejudicando o autor, em regra, um hipossuficiente.

A criação do processo eletrônico pela Lei 11.419/06, veio para eliminar entre 70 a 80% a demora do processo em papel. É uma tecnologia que não tem volta. As partes já se acostumaram, nos juizados federais, a comparecer logo com suas testemunhas para, na impossibilidade de conciliação, produzirem suas provas, tudo num mesmo dia e, assim, durante todos os anos, obterem o imediato julgamento, até porque a audiência é e sempre foi una. Julgar rapidamente é tão legal ou até mais do que só conciliar.

AGAPITO MACHADO
juiz federal e professor universitário

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